Hotel Moderno, em Santa Teresa: A história do luxo, do lixo e da espionagem nazista

Introdução

Em Santa Teresa, o Hotel Moderno conta a história do luxo, do desperdício e da espionagem nazista.
O Hotel Moderno, um dos requintes da Belle Époque carioca, transformou-se de refúgio de celebridades em esconderijo de nazistas em apenas 20 anos. Atualmente, é um cortiço deteriorado que pertence ao Governo Federal.

Inauguração

Quando foi inaugurado em 1914, o Hotel Moderno, situado na Rua Cândido Mendes, número 283, em Santa Teresa, no coração do Rio de Janeiro, oferecia uma vista espetacular para a Baía de Guanabara e o Pão de Açúcar. O edifício, mesmo deteriorado, persiste e sua trajetória é digna de um longa-metragem.
O casarão de estilo eclético, de quatro andares, possuía 65 quartos e todas as comodidades modernas da época, incluindo eletricidade, dois elevadores, água quente e fria em todos os quartos, ventiladores de teto, um amplo restaurante e refeitório, além de nada menos que sete banheiros com água quente e telefones. Portanto, o termo Moderno.

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Conforme a publicidade daquele período, o hotel possuía uma “cozinha internacional” e todos os seus colaboradores dominavam fluentemente os idiomas francês, inglês, espanhol e alemão. Os anúncios ressaltavam também como características do Moderno: o silêncio, a pureza do ar da parte alta de Santa Teresa e a falta de “pó” (poluição atmosférica). Com tantas qualidades, o Moderno – ou Moderne – era praticamente uma residência francesa de destaque.

A coreógrafa e bailarina norte-americana Isadora Duncan, nas dependências do Hotel Moderno (Reprodução da Internet)

Nomes proeminentes se hospedaram no Hotel Moderno, incluindo Isadora Duncan, bailarina e coreógrafa dos Estados Unidos, precursora da dança contemporânea. Duncan era uma das frequentadoras do palacete da mecenas e herdeira do grupo Mate Laranjeira, a feminista Laurinda Santos Lobo, também conhecida como a “marechala da elegância“. Ela era sobrinha de Joaquim Murtinho. A então elegantérrima residência de Laurinda ficava próxima ao Largo do Curvelo, onde hoje é o Parque das Ruínas.

A sofisticação e a modernidade do renomado hotel não conseguiram resistir às transformações sociais e econômicas do período, resultando no encerramento de suas atividades e deixando órfãos uma multidão de hóspedes e admiradores dos tempos do Rio Antigo. Por um longo período, ele também foi conhecido como Hotel Inglês, apesar de nunca ter sido esse o seu nome oficial.

O espião nazista Otto Sererus comprou o Hotel Moderno em nome da ideologia nazista / Foto: Diário da Noite

Durante a década de 1940, o Hotel Moderno voltou a ganhar destaque no Rio, após a polêmica envolvendo o advogado Otto Surerus, descendente direto de alemães. Ele foi acusado de espionagem pelo Procurador do Tribunal de Segurança, Gilberto de Andrade, que o ameaçou de morte devido à acusação, ameaçando provocar a ira do então poderoso regime nazista alemão.
Surerus fazia parte de uma rede de espiões vinculada a um grupo nazista liderado pelo austríaco naturalizado brasileiro, Ferdinand Baron Bianchi. Seu objetivo era auxiliar a Alemanha nazista na guerra, além de propagar os princípios hitlerianos no Brasil.

A propaganda do Hotel Moderno estava à altura de sua beleza e nobre localização, antes de sua venda ao espião nazista Otto Sererus

Em outubro de 1940, Otto Sererus adquiriu o charmoso edifício do Hotel Moderno, que era utilizado para propósitos partidários nazistas e atividades de espionagem. Otto proferia calúnias e ameaças contra autoridades e outros cidadãos, acolhendo outros nazistas e utilizando o local para encontros e tramas conspiratórias. Lá, foram descobertos documentos confidenciais do governo brasileiro, num episódio de espionagem internacional digno de cinema.

Em uma correspondência dirigida ao então procurador Gilberto de Andrade, Otto Sererus declarava:
“Antes que eu possa sentir o prazer de ser preso e condenado por espionagem, a poderosa e invencível Alemanha triunfará, e Hitler ordenará que te cortem a cabeça.”

Por infortúnio geográfico, nasci no Brasil, que ainda precisa de dois a três séculos de colonização sob o domínio alemão. E Deus o desejará, um de nós! Otto foi detido, juntamente com outros integrantes do grupo de agentes nazistas que operavam no Brasil, tanto no edifício do Hotel quanto em uma residência localizada na Rua Joaquim Murtinho.

Com a detenção dos apoiadores de Hitler, que utilizavam o Hotel Moderno para organizar encontros e conspirar contra indivíduos e a nação brasileira, suas operações foram novamente suspensas. Posteriormente, começou a ser alugado por empresas produtoras de cinema. Depois, foi arrendado a uma organização católica, que finalmente o deixou de lado. Posteriormente, provavelmente de maneira não oficial, os seus quartos começaram a ser alugados, como acontece em apartamentos comuns.

Na década de 1990, a situação piorou ainda mais, transformando o Hotel Moderno em um autêntico cortiço que persiste até hoje, sem apresentar sequer um resquício do luxo e sofiticação do passado. A aparência externa está deteriorada, enquanto o interior está quase completamente destruído, o que lhe rendeu o apelido de “pulgueiro chique” pelos habitantes da região.

Atualmente

Conforme apurado pela reportagem, o imóvel, mesmo tendo sido invadido por vários residentes, é de propriedade da União Federal, desde que foi confiscado pelos nazistas na década de 40.As imagens do site Rio – Casas e Prédios Antigos, de autoria de Rafael Bokor, revelam o estado deplorável em que se encontra atualmente o belo edifício. Espero que um dia seja vendido a alguém capaz de restabelecer sua glória de tempos passados. No término do Governo Bolsonaro, a Superintendência do Patrimônio da União tentou vender a propriedade por meio de um programa de desinvestimento, porém a transação não progrediu. Os invasores persistem no local, alegando possuir direitos de propriedade; contudo, não há usucapião em propriedade pública, e o edifício atualmente pertence ao Governo Federal.

Nosso artigo foi inspirado no, Hotel Moderno, em Santa Teresa: A história do luxo, do lixo e da espionagem nazista – Diário do Rio de Janeiro

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